sexta-feira, 16 de setembro de 2011


Este é o texto da Avaliação Global - 3º bimestre 2011

Terminada a guerra de Troia, que durou dez anos, Odisseu e seus companheiros saem em direção a Ítaca.  No mar, a esquadra inicial é de doze navios.  São muitas as perdas no caminho...  No único navio que resta, chegam à ilha de Circe.  A feiticeira, que sabia da existência de Odisseu e esperava por ele, promete ajudá-lo a sair da ilha, desde que viva com ela por um mês.  Passa-se um ano, e é preciso que Polites lembre Odisseu de que já se demoraram demais ali.  É exatamente desse momento da história que fala o texto a seguir. 

Um vivo entre os mortos                                   


O mês se tornou uma estação.  A estação se estendeu a um ano.  E somente então é que Odisseu voltou a pensar em seu reino de três ilhas.  A vida com Circe era tão doce quanto a fruta do lótus: era capaz de levar um homem a esquecer seu lar e sua família. Então seu melhor amigo, Polites, veio até ele e disse:
¾ A memória de Posêidon pode ser longa ou pode ser curta, mas a sua, Odisseu, já o abandonou totalmente se você tiver esquecido sua bela rainha.  Seus homens têm mulheres e filhos, também, e já estivemos longe deles, agora, por mais de onze anos!
Assim, Odisseu foi até Circe e abraçou-a como que para se desculpar, dizendo:
¾ É tempo de partir.  Um ano atrás, você prometeu que me enviaria a um lugar onde poderei conhecer o caminho para casa e o segredo das coisas por vir.  Quem é esse oráculo?  Onde o encontrarei?
Circe mordeu o lábio inferior e cerrou os punhos:
            ¾ Muito bem.  Eu lhe direi.  Estava escrito, desde que nasci, que eu o amaria e o perderia.  Mas as orientações que lhe darei não lhe agradarão.  Talvez você não ouse segui-las.
            ¾ Não se atreva, senhora!  Eu sou Odisseu, rei de Ítaca, herói de Troia, cujas façanhas...
            ¾ Sim, sim...  Tudo bem.  Sua trilha tem de passar pelas sombras do mundo inferior. Lá, entre os espíritos dos mortos, você encontrará o oráculo Tirésias.  Ele pode lhe dizer o que já houve e o que há de haver, e também o que é verdadeiro.
¾ Não! ¾  gritou Odisseu.  Pôs as mãos sobre os ouvidos e apertou bem os olhos. ¾  Não! Não! Não! Retire o que disse, Circe!  Veja como estou tremendo! Veja como o suor escorre do meu rosto!  Retire o que disse, Circe, ou transformará num covarde um homem que encarou a morte nos olhos cinquenta vezes e nunca vacilou!  Descer ao mundo inferior antes de minha hora?  Esfregar meu rosto no de fantasmas na escuridão sem fim?  Zeus! O coração de um homem se despedaçaria!  Não!  Nunca!  Não! 
            Circe permanecia calada, e seus olhos se deliciaram com a ideia de que Odisseu agora ficaria com ela para sempre.  Ele se atirou no divã branco da feiticeira e uivou como um lobo por mais de uma hora.  Em seguida, ficou de pé, respirou fundo três vezes, endireitou os ombros e rumou para a praia, onde seus homens dormiam junto ao navio.
            ¾ A bordo, homens!  A bordo, já, e eu comandarei o leme!  Circe, a feiticeira, me explicou nosso caminho para casa, e é tempo de içar velas!
            Enquanto o casco do veloz navio negro de proa vermelha era arrastado pela areia branca e suas pranchas secas inchavam ao toque do mar, Circe desceu correndo até a praia e penetrou nas ondas até a água lhe tocar os joelhos.
            ¾ Que os deuses olhem por você, Odisseu!  Dirija o navio no rumo do sol poente.  Ali o rio Oceano puxará vocês sem necessidade de remar.  Firme o leme e faça um sacrifício a Hades, o deus dos mortos.

               Odisseia, Homero. Ed. Ática, col. O tesouro dos clássicos juvenil,  págs. 61-63.