domingo, 16 de agosto de 2009

Eu nunca vou crescer?

Walter nasceu antes de mim. Ele tem uma sorte!
Agora ele está com dez anos e eu estou com sete. Quando ele estiver com onze, vou estar com oito. Mesmo quando eu estiver com trinta anos, não vou conseguir alcançá-lo: ele vai ter trinta e três.
Dificilmente eu uso roupas novas.
Quando Walter ganha camisas novas, fico com as velhas. Quando ganha jeans novos, fico com os velhos.
Às vezes as calças já estão remendadas. Odeio jeans remendados.
As chuteiras que ficaram pequenas para Walter, passam para mim. A bola de futebol que ele não usa mais, passa para mim.
Quando Walter ganhou patins de gelo, os de roda vieram para mim - sem a chave de regular o tamanho.
Fico até com os seus antigos professores.
Às vezes minha professora diz:
-David, por que você não consegue se parecer um pouquinho com seu irmão?
Ou:
-Walter nunca falava comigo dessa maneira.
Ou:
-Walter sempre fazia a lição de casa.
Às vezes parece que as pessoas nem se lembram do meu nome. De vez em quando vovó me chama de Walter.
-Eu sou o David - digo para ela.
Mas ela se esquece e daí a pouco torna a dizer:
-Vem cá, Walter
São essas coisas que às vezes me fazem desejar que não existisse Walter.

Eu nunca vou crescer? Trad. de Fernanda Lopes de Almeida.


Vamos discutir o texto

Personagens - características e falas

1. Quais são as características de Walter? E as de David?

2. Por que a idade de Walter incomoda David? Justifique sua resposta.

3. Retire do texto falas de David que comprovam seu ciúme em relação ao irmão.

4. As falas da professora sobre Walter e David deixam claro o quê?

5. Comente as afirmações que estejam de acordo com o texto:

a) Os irmãos sempre são iguais interiormente.
b) Nem sempre ocorre ciúme entre irmãos.
c) As comparações entre irmãos nem sempre são positivas e não surtem o efeito desejado.

Interpretação crítica

1. Às vezes algumas pessoas dizem: "Como eu gostaria de ser fulano(a) de tal" ou "Queria ser parecido(a) com...". Isto já ocorreu com você? Comente.

2. O ciúme pode tornar uma pessoa profundamente infeliz, violenta e desequilibrada. Comente.

3. Se você estivesse no lugar de David, que coisas também lhe causariam desagrado?

4. Só os irmãos mais novos sentem ciúme dos irmãos mais velhos? Comprove sua resposta.

5. David demonstra mau caráter quando afirma: "São essas coisas que às vezes me fazem desejar que não existisse Walter"?

6. a) Você tem irmão(s) ou irmã(s)?
b) Você é filho(a) único(a)?
c) Ser filho único é bom? Por quê?
d) Ter irmãos é bom? Por quê?

7. Você acha errado que os irmãos mais novos aproveitem roupas, brinquedos dos mais velhos? Dê seu ponto de vista.

8. Existem pais que agem de modo diferente com determinados filhos? Por quê?

9. Assim como há irmãos que se parecem muito física e interiormente, há também aqueles que não têm semelhança alguma. Por que filhos dos mesmos pais podem ser tão diferentes?

10. Por vezes, você também gostaria de ter outra idade? Por que isso acontece?
O trecho a seguir é uma doce descrição que José Lins faz de sua mãe. Leia-o

Dona Clarisse

Todos os retratos que tenho de minha mãe não me dão nunca a verdadeira fisionomia que eu guardo dela - a doce fisionomia daquele seu rosto, daquela melancólica beleza de seu olhar. Ela passava o dia inteiro comigo. Era pequena e tinha os cabelos pretos. Junto dela eu não sentia necessidade de meus brinquedos. D. Clarisse, como lhe chamavam os criados, parecia mesmo uma figura de estampa. Falava para todos com um tom de voz de quem pedisse um favor, mansa e terna como uma menina de internato. Criara-se em colégio de freiras, sem mãe, pois o pai ficara viúvo quando ela ainda não falava. Filha de senhor de engenho, parecia mais, pelo que me contavam dos seus modos, uma dama nascida para a reclusão.

REGO, José Lins do. Menino de Engenho. 68ª ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1997. p. 5.

De acordo com a descrição acima, associe os substantivos a seus respectivos adjetivos.

( 1 ) fisionomia ( ) pretos
( 2 ) beleza ( ) verdadeira
( 3 ) cabelos ( ) melancólica

Leia a crítica do livro A menina que brincava com fogo e circule os adjetivos que se relacionam aos substantivos destacados.

A MENINA QUE BRINCAVA COM FOGO, de Stieg Larsson (tradução de Dorothée de Bruchard; Companhia das Letras; 608 páginas; 49 reais)

O escritor sueco Stieg Larsson morreu em 2004, antes de assistir ao sucesso da trilogia Millenium, a saga policial de sua autoria que já vendeu mais de 10 milhões de exemplares em todo o mundo. Neste segundo volume da série, a heroína Lisbeth Salander, uma rebelde e destemida invasora de computadores, é procurada pela polícia como suspeita de três assassinatos brutais. O editor-chefe da revista Millenium, Mikael Blomkvist, seu ex-namorado, acredita na inocência da jovem – ao contrário da imprensa. Larsson segue com habilidade as regras clássicas dos grandes thrillers, numa história que envolve um forte esquema de corrupção de promotores, jornalistas, juízes e policiais.

http://veja.abril.com.br/150409/veja_recomenda.shtml


Resposta aqui!
( 3 )
( 1 )
( 2 )

sueco
policial
rebelde e destemida
brutais
clássicas
grandes
forte

sábado, 15 de agosto de 2009

Posição do adjetivo

Pobre menina rica

Pobre menina rica, tão rica
Que triste você fica se vê
Um passarinho em liberdade
Indo e vindo à vontade na tarde

Vinícius de Moraes

No primeiro verso, a menina é caracterizada com duas qualidades opostas: pobre e rica. Qual o significado desses dois adjetivos no poema?

A frase a seguir se encontra no grau comparativo de superioridade:

A avaliação parcial será mais fácil que a global.

Reescreva-a agora no grau comparativo de igualdade, depois no de inferioridade.

Coloque agora o adjetivo da frase inicial no grau superlativo absoluto sintético.


Resposta aqui!
Rica diz respeito à condição financeira; pobre refere-se ao estado emocional da menina, remete a sua tristeza, talvez seu sentimento de solidão. Apesar de ter dinheiro, ela é triste.

A avaliação parcial será tão fácil quanto a global.
A avaliação parcial será menos fácil que a global.

A avaliação parcial será facílima.
marítima - ilimitada - glacial - escolar - abdominal - aquática - alcoólico - solar - cerebral - fluvial - urbana - etária - silvestres - selvagens - umbilical - infantil - materno - manual - suína
Transforme as locuções adjetivas a seguir em adjetivos simples.

Brisa do mar
Confiança sem limites
Era do gelo
Material de escola
Região do abdômen

Planta da água
Teor de álcool
Raio de sol
Atividade do cérebro
Bacia de rio
Área da cidade
Faixa de idade
Frutinhas da selva
Animais da selva
Cordão do umbigo
Comportamento de criança
Amor de mãe
Trabalho com a mão
Carne de porco


Obs.: Convém observar que nem sempre a locução adjetiva possui um adjetivo correspondente. Veja:

janela de cima
menino de rua
artigo de primeira
história sem pé nem cabeça
ninhos de pássaros
jogo de lençol



Resposta aqui!

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

As oxítonas acentuadas e as proparoxítonas presentes no texto são:

Oxítonas

ninguém
após
francês
também
além
até


Proparoxítonas

histórico
Itálico
olímpico
rápido
sábado
Olimpíadas
Respostas do exercício sobre adjetivos pátrios:

Espírito Santo
Rio Grande do Sul
Rio de Janeiro (capital)
Rio Grande do Norte

americano - Estados Unidos
alemã - Alemanha
finlandês - Finlândia
indianos - Índia
chinesas - China
guatemalteca - Guatemala
israelenses - Israel
russos - Rússia
britânico - Grã Bretanha ou Reino Unido
mexicano - México
As palavras utilizadas para indicar a procedência ou nacionalidade são chamadas de adjetivos pátrios ou gentílicos.

Eis alguns exemplos: campinense, paraibano, nordestino, brasileiro, europeu, asiático...

Você sabe a que estado do Brasil pertencem as pessoas designadas pelos adjetivos pátrios abaixo?

Capixaba
Gaúcho
Carioca
Potiguar


Veja como os adjetivos pátrios fazem parte de nosso dia a dia. Eles aparecem em diferentes notícias e manchetes de jornais todos os dias. Identifique os que aparecem nos títulos a seguir e escreva a que lugares se referem.

Americano mantém dois crocodilos como animais de estimação
Noiva alemã passa noite de núpcias com caixa de vodca
Finlandês conquista título mundial de sauna
Indianos celebram casamento de casal de burros
Chinesas viajam para fazer plástica, mas são barradas na volta
Guatemalteca inventa seqüestro para passar mais tempo com amante

Cidade israelense oferece US$ 1 milhão para quem achar sereia em sua costa
Russos mostram criatividade e fazem campeonato com aviões caseiros
Britânico busca recorde com bolhas de sabão

Mexicanos fazem sanduíche de 46 metros.

Manchetes retiradas do endereço: http://g1.globo.com/Noticias em 13 de agosto de 2009.

Resposta aqui



Cinquenta e seis dias no oceano Atlântico. Amyr ultrapassa metade do percurso. Tempo de pensar. Estaria Amyr sentindo solidão?...

No domingo, 5 de agosto, completava a oitava semana no mar. Finalmente eu passei a metade da distância entre o ponto de partida e a costa do Brasil. Meio Atlântico estava cumprido. E decidi, após o expediente, fechar para balanço. Esse tinha sido um momento ansiosamente aguardado. Até então eu contava as frações da viagem: um quinto, um quarto, um terço. Mas agora era diferente. Metade! Deveria me sentir na descida final, mas infelizmente não havia descida nenhuma à minha frente, só mar. Percebi que só estaria na reta final quando realmente estivesse ganhando latitude e indo para o sul; até então, em nenhum dia eu deixara de ir para o norte... Estava acima de Salvador e deveria continuar subindo por talvez mais uma semana.

Estava, sim, feliz, porque após tanto tempo e metade do meu sonho realizado, ao invés de cansado ou desesperado para chegar, estava animado e extraordinariamente mais disposto do que quando partira de Lüderitz. Sempre pensava em chegar, mas de uma forma distante e vaga. Agora as coisas mudavam: em vez de contar as milhas que já cumprira, contaria as que faltavam. Era muito diferente. Do ponto de vista técnico, a metade era ainda mais importante. Pude enfim avaliar a precisão logística na preparação dos equipamentos e suprimentos.

Água, alimentos, gás, havia ainda com sobra para concluir a outra metade. Peças de reposição, oficina, farmácia, intactas. Quebras de material, desgaste, não havia. Fantástico! Tudo exatamente como previra, até mesmo um pouco melhor. A saúde estava perfeita. Nenhum incidente. Nem mesmo espinha, furúnculo ou qualquer tipo de problema com a pele, olhos ou sistema digestivo, tão comuns em longas permanências no mar. (...)

Mas a mais extraordinária emoção foi a certeza de que eu seria perfeitamente capaz de repetir o que fora feito até então. Distante de qualquer ponto, duas eternidades me separavam da terra. Uma, que deixava para trás, árida e assustadora; outra, que ganhava pela frente, maravilhosamente clara e azul. Sem dúvida, muitas surpresas ainda me aguardavam, mas, diante dos apuros por que já passara, nada poderia ser tão difícil. Situações que por nada no mundo enfrentaria novamente. No mar? Não! No mar tudo ia bem. Mas ainda em terra, quando tinha o mar pela frente, as coisas eram diferentes. (...)

Passados dois meses de tantas histórias, comecei a pensar no sentido da solidão. Um estado interior que não depende da distância nem do isolamento, um vazio que invade as pessoas e que a simples companhia ou presença humana não podem preencher, solidão foi a única coisa que eu não senti, depois de partir. Nunca. Em momento algum. Estava, sim, atacado de uma voraz saudade. De tudo e de todos, de coisas e pessoas que há muito tempo não via. Mas a saudade às vezes faz bem ao coração. Valoriza os sentimentos, acende as esperanças e apaga as distâncias. Quem tem um amigo, mesmo que um só, não importa onde se encontre, jamais sofrerá de solidão; poderá morrer de saudades, mas não estará só.

À medida que o tempo passava e a linha pontilhada na carta do Atlântico avançava em direção ao Brasil, em vez do peso do isolamento eu sentia o conforto e o apoio de pessoas que, sabia, estavam junto comigo, lado a lado, torcendo, rezando ou mesmo arrancando os últimos fios de cabelos, de preocupação.

E, isolado, também não estava. Ao redor, tudo era sinal de vida. Gaivotas e aves marinhas de todo tipo, as ondas com quem discutia, pilotos e fiéis dourados aumentando dia a dia. As imensas e amáveis baleias e mesmo os desagradáveis tubarões me faziam companhia. E, acima de tudo, havia o rádio e a formidável corrente de solidariedade que os colegas radioamadores mantinham acesa na ponta de suas antenas.

Tudo, menos solidão!

Amyr Klink. Cem dias entre céu e mar. 32ª Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 106-108.

Cem dias no mar... Finalmente, Amyr está de volta. Aproxima-se da costa brasileira...

12h35m: Alguns telhados já eram visíveis. E a espuma da arrebentação sobre os recifes também. O coração batia desesperado, a tensão era enorme. Logo estaria em cima deles. E, de repente... o barcoficou preso! Como? Não é possível! Não saía do lugar!

Equilibrando-me sobre o convés, fui gatinhando até a proa ver o que se passava: o leme estava enroscado numa rede de pesca. Deitado, tentei liberá-lo com o braço, mas não o alcancei. Apanhei, então, a bicheira que estava presa com os remos de reserva e soltei a rede. (...) Voltei ao trabalho mais nervoso ainda. Ao longe já se ouvia o barulho da arrebentação nos recifes. Por onde haveria uma passagem, se é que havia alguma?

Um estranho tuc-tuc... tuc-tuc-tuc... tuc... tuc... surgiu por trás. Infalível barulho que eu conhecia muito bem. Um antigo e persistente motor diesel de um cilindro, o mesmo que eu tinha na Rasa, se aproximava. Era um sofrido e minúsculo saveirinho com dois pescadores em cima e mais limo no casco do que uma plataforma submarina. Tonho das Neves e Tonho de Oliveiraeram seus nomes.

Chegaram perto, a uns quinze metros. O primeiro, segurando-se no toco que restara de um outrora mastro, e me olhando com um ar curioso e alegre, enquanto o segundo, enfurnado no motor fumacento, controlava a marcha lenta, berrou com força:

- Como foi a pescaria?

- Não estou pescando! - respondi, admirado com as rodelas de fumaça que subiam inteiras.

- De onde vem vindo, então? - insistiu.

- Venho da África! - exclamei.

- E onde fica essa praia?

Expliquei que era mais ou menos longe dali. O homem sorriu sem entender, com todos os dentes à mostra, e após me orientar sobre como encontrar a passagem nos recifes, pediu-me:

- Avisa o Doró que a gente só volta na sexta!

E eu parti na mais importante missão da minha vida: após cem dias completos, sem falar com alguém cara a cara, subitamente estava incumbido de levar um recado, em pessoa, para outro pescador que tampouco conhecia.A maré estava enchendo, e eu deveria tomar todo cuidado. O pescoço me doía de tanto remar com a cabeça virada, à procura da dita entrada. Vi algumas pessoas ao longe, na praia, um pouco ao sul, e rumei para ali. Grave erro. Já ouvindo o barulho das ondas, que por trás pareciam muito menores do que de fato eram, fui levantado por uma delas e levado em velocidade de encontro às pedras.

Não havia mais tempo para retornar. No meio das ondas e sobre perigosas pontas de recife procurei rápido uma mancha clara por onde pudesse passar, fazendo os remos envergarem de tanta força, e me preparei para atravessar com a onda seguinte. Duas testemunhas na praia acompanhavam à distância a mirabolante encrenca em que me metera. O barco levantou, partiu outra vez em velocidade e, após um levíssimo toque no pobre leme, entrou nas águas abrigadas, do lado de dentro dos recifes. Soltei a respiração, aliviado.

Eram exatamente 13hl0min, mas o porto onde estavam os outros barcos, na barra do rio Pojuca, ficava quinhentos metros ao norte, na direção do farol, e era ali, somente ali, que eu fundearia. Vinte minutos faltavam para a hora do comunicado. Correndo contra o relógio e desviando das pontas de recife, subi o canal sem tirar os olhos do relógio.

Às 13hl9min, alcancei o remanso da barra onde estavam sete barquinhos. Larguei os remos, voei para a âncora, encurtei o cabo e lancei-a em fundo de areia, a vinte metros da praia. ( ... )

Amyr Klink
. Cem dias entre céu e mar. 32ª Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 148-150.

Nesse trecho, Amyr percebe que está sendo seguido por dourados há dias. Muito estranho isso... Ele sabe que não está livre de um "ataque" de baleia.

Durante o dia, enquanto remava, notei a presença de alguns peixes que há algum tempo me acompanhavam. Eram dourados e, prestando muita atenção, percebi serem os mesmos de alguns dias atrás.

Curiosa companhia. Pude mesmo identificar um, de coloração menos intensa, que batizei de Alcebíades, em homenagem a um morcego que residia no sótão de casa, em Paraty, e que após muitas tentativas frustradas de expulsão resolvi adotar como amigo.

Parei de remar, e eles começaram a dar voltas no barco. Por que me seguiriam?

O tempo bom e o mar tranqüilo eram uma oportuna ocasião para se fazer uma inspeção no fundo. Com certeza o limo deveria estar atraindo os dourados e, após um mês, já era tempo de uma limpeza geral. Não me agradava muito a ideia de entrar na água, não só pela lembrança de tantas barbatanas suspeitas, mas também porque fazia frio. Aproveitando o intervalo do almoço, vesti pela primeira vez a roupa de borracha. Deliciosa sensação. O calor da roupa me trouxe coragem e, munido de máscara, pés-de-pato e escova, pulei na água amarrado a um cabo.

Por baixo da água, um impressionante cenário: cinco ou seis dourados, sempre a uma pequena mas prudente distância, e, junto do leme, um bando de minúsculos pilotos, fielmente acompanhando o barco. Senti-me tão importante quanto um velho tubarão, sempre cercado por seu séquito desses pequenos e listrados peixinhos. (...)

O casco estava coberto de um limo que saiu sem muita dificuldade. Mas, mergulhando por baixo, percebi que em certos lugares os raspões provocados pelos tubarões haviam removido parte da tinta e aí começavam a formar-se pequenos moluscos que a escova não conseguia remover. Era o início de grandes problemas com a tinta.

De modo geral, as tintas de fundo são feitas à base de cobre, e, por essa razão, apresentam cor vermelho-alaranjada.

Após estudar de modo atento perto de quarenta relatos de acidentes com veleiros, em que mais da metade foi provocada por colisão com baleias, e ao tomar conhecimento de um estudo sobre atração e repulsão de cetáceos em relação à cor, que não recomendava cores como o vermelho no fundo das embarcações, pois poderiam atrair estes enormes mamíferos,optei por uma tinta especial de cor verde.

Não depositava muita fé nesse estudo, mas sabia que o problema com baleias não existe porque sejam agressivas, mas porque sendo excessivamente dóceis e curiosas costumam aproximar-se de veleiros ou embarcações que, sem motor ou outra fonte de vibração, não as espantam. E o carinho de um animal que ultrapassa quarenta toneladas e mais de quinze metros, às vezes; pode ser trágico para um barquinho com menos de seis metros.

Ao tentar remover os moluscos do fundo percebi que havia cometido uma asneira. Ao invés de passar várias demãos como pensava, atendi ao desastrado conselho do estaleiro que fizera a pintura e aplicara somente uma. A tinta não tinha boa aderência ao casco e soltava-se com facilidade.

Dentro da água, lembrei-me da surra de perguntas que me faziam antes de partir, em especial de uma feita por um amigo argentino, da Control, em São Paulo, onde foi feita a instalação elétrica e mecânica.Os funcionários da fábrica, na hora do almoço, em volta do barco, e ele me metralhando com sucessivas rajadas de perguntas:

- E se a água acabar?

- Eu aciono o destilador solar - respondi.

- E se a bateria falhar?

- Eu tenho os painéis solares e as baterias de emergência.

- E se o barco capotar?

- Eu uso o sistema de lastros líquidos.

- E se uma baleia atacar?

- Eu pinto o fundo de verde.

- E se for uma baleia daltônica?

Perdi a paciência e saí correndo atrás do meu inquisidor.

Mas ele tinha toda razão. Se uma baleia se aproximasse durante a noite, de nada adiantariam os coloridos estudos sobre a atração de cetáceos no fundo escuro do mar.

Amyr Klink. Cem dias entre céu e mar. 32ª Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995,p.66-68

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Um menino observador e sensível relata suas impressões sobre o relacionamento entre as pessoas, os sentimentos, as emoções, a vida, enfim. Vamos conhecer um pouco desse seu modo de ver o mundo?


Menino sentindo mil coisas

Na vida muita coisa parece que é e é, e muita coisa parece que é mas não é. Fora isso, muita coisa acontece e a gente nem vê. Não tem nada no jardim e quando a gente vai ver, brotou uma flor. Uma pessoa pode estar sonhando acordada do lado da gente e a gente não percebe. Uma pulga conversa com outra pulga atrás de uma orelha e o dono da orelha nem desconfia. Dois colegas estão ao nosso lado. Um, cheio de ideias na cabeça, outro, cheio de piolhos, e a gente ali, calmamente, sem saber de nada.

Uma coisa é certa: quando a gente conhece uma pessoa, a gente sempre ou gosta ou não gosta. Se gosta, gosta sem saber por quê. Não dá para explicar. Gosta porque gosta. Gosta porque sente uma coisa boa no ar. Ou por causa de um certo jeito, de um sorriso, um brilho nos olhos.

Quando não gosta é a mesma coisa. A pessoa não fez nada de errado, mas a gente sente uma coisa esquisita, fica sem confiança, sem vontade de ficar perto. Às vezes a gente está certo. Outras vezes não.

Quando eu mudei de escola, o Diogo sentava na carteira da frente. Não fui com a cara dele nem ele com a minha. Uma vez a gente até se pegou de tapa por causa de nada. O tempo passou e a gente se conheceu melhor. Hoje, o Diogo é meu amigo do peito. A gente joga bola todo dia, fez coleção de figurinha junto, torce para o mesmo glorioso time, participa do campeonato de botão e acha a Gabriela mais linda do que toda as meninas da classe, da escola, do bairro, da cidade e até do país inteiro também.

A dona Josefa, bisavó da Tatiana, fuma charuto e acredita em alma do além e fantasma do outro mundo.

O professor Barbosa garante que a ciência moderna um dia vai conseguir decifrar todos os mistérios do mundo em que vivemos.

O Carlão tem certeza absoluta de que o Corinthians, dessa vez, vai conseguir ganhar o campeonato brasileiro com um pé nas costas.

Pode ser.

Outro dia, o Beto apareceu com dor de dente e meu avô disse, com aquela voz velha dele: – Aguenta firme. Isso passa. É como dizia o Barão de Itararé: na vida, tirando o motorista e o cobrador, todo o resto é passageiro!

Sei lá quem é o Barão de Itararé e sei lá se tudo é passageiro, mas que a vida parece um livro cheio de quase tudo, parece. E um livro cheio de quase tudo é sempre um livro cheio de mil coisas da vida.

AZEVEDO, Ricardo. Menino sentindo mil coisas. São Paulo, Ática, 1995, p. 17-23.

domingo, 9 de agosto de 2009

Dois e dois são quatro

Como dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
embora o pão seja caro
e a liberdade pequena
Como teus olhos são claros
e a tua pele, morena
como é azul o oceano
e a lagoa, serena
como um tempo de alegria
por trás do terror me acena
e a noite carrega o dia
no seu colo de açucena

- sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade pequena.


Ferreira Gullar
Nem tudo

Nem tudo o que busco
é flor.
Nem tudo o que encontro,
luz.

Nem tudo o que amo
é céu.
Nem tudo o que crio,
cor.

Mas tudo o que encontro
é busca
e tudo o que busco,
amor.

Maria Dinorah Prado
Lembrança do Mundo Antigo

Clara passeava no jardim com as crianças.
O céu era verde sobre o gramado,
a água era dourada sob as pontes,
outros elementos eram azuis, róseos, alaranjados,
o guarda-civil sorria, passavam bicicletas,
a menina pisou a relva para pegar um pássaro,
o mundo inteiro, a Alemanha, a China,tudo era
tranquilo em redor de Clara.
As crianças olhavam para o céu: não era proibido.
A boca, o nariz, os olhos estavam abertos. Não havia
perigo.
Os perigos que Clara temia eram a gripe, o calor, os
insetos.
Clara tinha medo de perder o bonde das 11 horas,
esperava cartas que custavam a chegar,
nem sempre podia usar vestido novo. Mas passeava no
jardim, pela manhã!!!

Havia jardins, havia manhãs naquele tempo!!!


Carlos Drummond de Andrade

I D E A I S

Os outros meninos, um queria ser médico,
outro pirata, outro engenheiro, ou advogado, ou general.
Eu queria ser pajem medieval... Mas isso não é nada. Hoje eu queria ser uma coisa mais louca: eu queria ser eu mesmo!

Mário Quintana. Sapato furado. São Paulo, FTD, 1994.
Ou isto ou aquilo

Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Cecília Meireles. Ou isto ou aquilo.
Fruta no ponto

Às vezes dá vontade
de agarrar a vida
com uma duas
dez mãos
e levar à boca
e trincar nos dentes
como uma fruta
no ponto.

Fruta no ponto, Roseane Murray
Tal mãe, tal filha

Minha mãe diz que trovejo,
solto ventos e relâmpagos,
despenco tempestades
por uma coisinha de nada,
por uma besteirinha qualquer.

Quando ela entra numa guerra,
numa tempestade em copo d'água,
com todo o seu lado de fera,
fico com vontade de perguntar:
A quem será que eu puxei?

Cantigas de adolescer, Elias José.

Você sabe quem escolheu seu nome? Gosta dele ou queria ter outro? É o assunto do nosso próximo poema!

Nome da gente

Por que é que eu me chamo isso
e não me chamo aquilo?
Por que é que o jacaré
não se chama crocodilo?

Eu não gosto
do meu nome,
não fui eu
quem escolheu.
Eu não sei
por que se metem
com um nome
que é só meu!

O nenê
que vai nascer
vai chamar
como o padrinho,
vai chamar
como o vovô,
mas ninguém
vai perguntar
o que pensa
o coitadinho.

Foi meu pai quem decidiu
que o meu nome fosse aquele.
Isso só seria justo
se eu escolhesse
o nome dele.

Quando eu tiver um filho,
não vou pôr nome nenhum.
Quando ele for bem grande,
ele que procure um!

Pedro Bandeira. Cavalgando o arco-íris. São Paulo: Moderna, 1984.

sábado, 8 de agosto de 2009

VII
No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá
onde a criança diz: Eu escuto a cor dos
passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não
funciona para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um
verbo, ele delira.
E pois.
Em poesia que é a voz do poeta, que é a voz
de fazer nascimentos –
o verbo tem que pegar delírio.



Manoel de Barros. O livro das ignorãças.
FATOS CONSUMADOS

...e se eles te apertarem muito sobre o que quiseste dizer com um poema,
pergunta-lhes apenas o que Deus quis dizer com este nosso mundo...


Mário Quintana
COISAS NUMERADAS
I
Não esquecer que as nuvens
estão improvisando sempre,
mas a culpa é do vento.
II
Ah, essas esculturas de gaze
do vento, sempre errantes
entre o céu e a terra, como
os sonhos do homem.
III
A voz do vento...Ninguém
sabe o que o vento quer
dizer...Quem me faz uma
letra para a voz do vento?


Mário Quintana

Mas vejam só como foi inventado o ponto de interrogação!

A INVENÇÃO DO PONTO DE INTERROGAÇÃO

A escrita
já tinha sido inventada.
Todas as letras,
as sílabas, as palavras.
Mas houve uma fase
em que escrever uma frase
estava causando
a maior confusão.
Tudo porque ainda não existia
O ponto de interrogação.
Alguém escrevia
por exemplo
qualquer coisa besta
como “Hoje você vai à festa”
e recebia como resposta
algo assim:
“Você não manda em mim”.
E logo tinha que esclarecer:
“Sua anta, isso era só uma pergunta”.
Pronto, virava uma briga
só por causa do ponto.
Até que alguém se deu conta
que quem pergunta
não apenas fala,
mas também escuta.
Então deu na sua telha
de colocar sobre o ponto final
o desenho de uma orelha.
Já prestou atenção?
Tem uma orelha
no ponto de interrogação.


Ricardo Silvestrin
Este poema descreve aspectos da vida de uma criança abandonada, que dorme debaixo de viadutos e usa os letreiros luminosos como cartilha...

Se essa rua fosse minha

Eu sou a luz do mundo e ninguém me vê aqui
Eu sou o sal da terra e ninguém me sabe aqui
Brincando de existir
Ninguém pode me pegar
Eu sou a voz da vida, nada vai me calar

Pivete, capitão d'areia, trombadinha
A imensidão da noite para habitar
A lua, mas se essa rua fosse minha
Meu caminho, meu sono, meu zanzar

Ducha de chuva fria e sol de aquecedor
Cama de viaduto, carros de cobertor
Letreiros de bê-á-bá
Vitrines de ver TV
Beijo de cola e colo de esmola pra comer

Pivete, capitão d'areia, trombadinha
A imensidão da noite para habitar
A lua, mas se essa rua fosse minha
Meu caminho, meu sono, meu zanzar

Corre, menino, vem, menino, perto de mim.


Música de Djavan, letra de Gilberto Gil, Caetano Veloso, Chico Buarque e Arnaldo Antunes.
(Para o projeto social "Se essa rua fosse minha", 1991), Gilberto Gil - Todas as letras, Companhia das Letras, 1996.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Tempestade

– Menino,vem para dentro,
olha a chuva lá na serra,
olha como vem o vento!

– Ah! como a chuva é bonita
e como o vento é valente!

– Não sejas doido,menino,
esse vento te carrega,
essa chuva te derrete!

– Eu não sou feito de açúcar
para derreter na chuva.
Eu tenho força nas pernas
para lutar contra o vento!

E enquanto o vento soprava
e enquanto a chuva caía,
que nem um pinto molhado,
teimoso como ele só:

– Gosto de chuva com vento,
gosto de vento com chuva!

Henriqueta Lisboa. O menino poeta. Porto Alegre, Mercado Aberto, s.d. p.14.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Balada da neve

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim...


É talvez a ventania:
mas, há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...


Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.


Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!


Olho-a através da vidraça:
Pôs tudo da cor de linho;
Passa gente, e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho.


Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...


E descalcinhos, doridos...
a neve deixa ainda vê-los:
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...


Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...


Uma infinita tristeza
e uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na natureza...
- e cai no meu coração.


Augusto Gil. In: Henriqueta Lisboa. Antologia escolar de poemas para a infância. Rio de Janeiro, Ediouro. pp. 64-65.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

COMPETIÇÃO

O mar é belo.
Muito mais belo é ver um barco
no mar.

O pássaro é belo.
Muito mais belo é hoje o homem
voar.

A lua é bela.
Muito mais bela é uma viagem
lunar.

Belo é o abismo.
Muito mais belo o arco da ponte
no ar.

A onda é bela.
Muito mais belo é uma mulher
nadar.

Bela é a montanha.
Mais belo é o túnel para alguém
passar.

Bela é uma nuvem.
Mais bela é vê-la de um último
andar.

Belo é o azul.
Mais belo o que Cézanne soube
pintar.

Porém mais belo
que o de Cézanne, o azul do teu
olhar.

O mar é belo.
Muito mais belo é ver um barco
no mar.

Cassiano Ricardo. *Antologia poética*. Rio de Janeiro, Editora do Autor, 1964, p. 180-181.

sábado, 1 de agosto de 2009

Mais um texto sobre o grande César Cielo. Após o texto, há uma pequena atividade.

01/08/09 - 13h20 - Atualizado em 01/08/09 - 16h29


Com banca de imperador, Cielo arranca ouro histórico nos 50m e conquista Roma

Brasileiro voa na piscina do Foro Itálico, bate o recorde do campeonato e se iguala a Alexander Popov como campeão olímpico e mundial da prova

Lydia Gismondi Direto de Roma


Foram duas batidas no peito, que àquela altura já estava todo avermelhado. O sinal da cruz se repetiu quatro vezes, e o dedo indicador não parava de apontar para o céu. César Cielo tinha acabado de plantar uma certeza no Foro Itálico: quando os grandes estão dentro d'água, ninguém é mais rápido que ele. Após conquistar o ouro nos 100m livre, o brasileiro voltou a bater primeiro neste sábado, desta vez nos 50m, repetindo o feito dos Jogos de Pequim.
Cielo soca a água após a prova: o brasileiro agora é campeão olímpico e mundial nos 50m

Com o tempo de 21s08, o recorde mundial não veio – "apenas" o do campeonato. O francês Frédérick Bousquet continua sendo o dono da melhor marca (20s94), mas ainda não foi desta vez que ele conseguiu bater na frente do brasileiro. Em Roma, Bousquet ficou com a prata (21s21), e o também francês Amaury Leveaux conquistou o bronze (21s25). Cielo não apenas repetiu a vitória de Pequim como baixou seu tempo em relação aos Jogos (21s30).

- Eu não esperava isso depois das Olimpíadas. Nos 50m, é pura cabeça. Eu estava com a cabeça boa hoje, e agora quero comemorar muito. Quero festejar com todo mundo que me ajudou. A sensação de ter a torcida junto é muito boa. Estou na Itália, mas a sensação é de estar em casa. É espetacular. Isso é a realização do sonho – afirmou ao deixar a piscina

Cielo passa a ser o primeiro nadador do país a conquistar duas medalhas de ouro em um Campeonato Mundial. Além disso, crava seu nome na galeria dos grandes ao dividir com o russo Alexander Popov o feito de ganhar os ouros olímpico e mundial nos 50m. Até o rival Bousquet, dono da melhor marca do planeta, reconhece quem é o mais rápido das piscinas hoje:

- Não acho que exista hoje um atleta melhor que Cielo na piscina. O que o faz ganhar é a determinação. É o tipo de atleta que acredita nele mesmo - elogiou o nadador francês.


Identifique todas as palavras oxítonas (acentuadas) e proparoxítonas presentes no texto.