terça-feira, 19 de agosto de 2008


A IARA

— Vamos à cachoeira onde mora a Iara — disse. — Essa rainha das águas costuma aparecer sobre as pedras nas noites de lua. É muito possível que possamos surpreendê-la a pentear seus lindos cabelos verdes com o pente de ouro que usa.

— Dizem que é criatura muito perigosa — murmurou Pedrinho.

— Perigosíssima — declarou o Saci. — Todo cuidado é pouco. A beleza da Iara dói tanto na vista dos homens que os cega e os puxa para o fundo d’água. A Iara tem a mesma beleza venenosa das sereias. Você vai fazer tudo direitinho como eu mandar. Do contrário, era uma vez o neto de Dona Benta!...

Pedrinho prometeu obedecer cegamente.

Andaram, andaram, andaram. Por fim, chegaram a uma grande cachoeira cujo ruído já vinham ouvindo de longe.

— É ali — disse o perneta, apontando. — É ali que ela costuma vir pentear-se ao luar. Mas você não pode vê-la. Tem de ficar bem quietinho, escondido aqui atrás desta pedra e sem licença de pôr os olhos na Iara. Se não fizer assim, há de arrepender-se amargamente. O menos que poderá acontecer é ficar cego.

Pedrinho prometeu, e de medo de não cumprir o prometido foi logo tapando os olhos com as mãos.

O Saci partiu, saltando de pedra em pedra, para logo desaparecer por entre as moitas de samambaias e begônias silvestres.

Vendo-se só, Pedrinho arrependeu-se de haver prometido conservar-se de olhos fechados. Já tinha visto o Lobisomem, o Caipora, o Curupira, a Cuca. Por que não havia de ver a Iara também? O que diziam do poder fatal de seus encantos certamente que era exagero. Além disso, poderia usar um recurso: espiar com um olho só. O gosto de contar a toda gente que tinha visto a famosa Iara valia bem um olho.

Assim pensando, e não podendo por mais tempo resistir à tentação, fez como o Saci: foi pulando de pedra em pedra, seguindo o mesmo caminho por ele seguido.

Súbito, estacou, como fulminado pelo raio. Ao galgar uma pedra mais alta do que as outras, viu, a cinqüenta metros de distância, uma ninfa de deslumbrante beleza, em repouso numa pedra verde de limo, a pentear-se com um pente de ouro os longos cabelos verdes cor do mar. Mirava-se no espelho das águas, que naquele ponto formavam uma bacia de superfície parada. Em torno dela centenas de vaga-lumes descreviam círculos no ar; eram a coroa viva da rainha das águas. Jóia bela assim, pensou Pedrinho, nenhuma rainha da terra jamais possuiu. A tonteira que a vista da Iara causa nos mortais tomou conta dele. Esqueceu até do seu plano de olhar com um olho só. Olhava com os dois arregaladíssimos, e cem olhos que tivesse, com todos os cem olharia.

Enquanto isso, ia o Saci se aproximando da mãe-d’água, cautelosamente, com infinitos de astúcia para que ela nada percebesse. Quando chegou a poucos metros de distância, deu um pulo de gato e nhoque! furtou-lhe um fio de cabelo.

O susto da Iara foi grande. Desferiu um grito e precipitou-se nas águas, desaparecendo.

(Monteiro Lobato. Viagem ao céu e O Saci. São Paulo: Brasiliense, 1950. p. 266-8, in Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães)

Estudo do texto:

1. O Saci não permitiu que Pedrinho se aproximasse da cachoeira porque o menos que poderia lhe acontecer era ficar cego.

a) O que poderia acontecer de mais grave a Pedrinho?
Resposta esperada: Pedrinho poderia ser atraído pela beleza da Iara, ser puxado para o fundo do rio e morrer afogado.

b) Que fato do texto comprova que o menino não resistiu à tentação de ver a rainha das águas?
Ele segue o mesmo caminho feito pelo Saci, pulando de pedra em pedra.

2. Segundo a lenda, o Saci-Pererê é um negrinho de uma perna só que anda sempre com um cachimbo na boca e usa um gorro vermelho. Maroto, gosta de pregar peças nas pessoas.

Há, nesse texto, algum fato que comprove esse modo de ser do Saci? Justifique sua resposta.
Sim; o fato de ele, usando de astúcia, furtar um fio de cabelo da Iara.

3. Por que, de acordo com a lógica da história, o Saci poderia se aproximar da Iara, e até vê-la, e Pedrinho não?
Espera-se que o aluno observe que o Saci pode vê-la sem sofrer nenhum dano porque é também uma entidade do folclore, é fruto da crença popular.

Estudos lingüísticos:

1. Nem todo “o”, “a”, “os” e “as” que encontramos são pronomes oblíquos. Muitas vezes são simples artigos definidos. Se eles acompanham um substantivo, são artigos; se, no entanto, substituem um substantivo, são pronomes oblíquos. Sabendo disso, dê a classe gramatical das palavras destacadas.
Use o código:

( a ) Pronome pessoal do caso oblíquo ( b ) Artigo definido

a. ( b ) ( a ) ( b ) Arranque os fios de cabelo da Iara e leve-os imediatamente para o sítio.
b.( b ) ( b ) ( a ) O saci recolheu os fios que ficaram sobre a pedra colocando-os imediatamente no bolso.


2. Destaque o substantivo que cada pronome pessoal oblíquo está substituindo.

a) A Iara costuma aparecer sobre as pedras nas noites de lua. É muito possível que possamos surpreendê-la a pentear seus lindos cabelos verdes com o pente de ouro que usa.

b) É ali que a Iara costuma vir pentear-se ao luar. Mas você não pode vê-la.

c) Enquanto isso, ia o Saci se aproximando da mãe-d’água. Quando chegou a poucos metros de distância, deu um pulo de gato e nhoque! furtou-lhe um fio de cabelo.

d) O Saci pediu a Pedrinho que não olhasse em direção à Iara. O garoto, teimoso, não lhe obedeceu.


3. Há, a seguir, pares de palavras. Acentue, adequadamente, apenas as paroxítonas.

a) caráter – temer b) órfão – solução c) tonel – túnel

4. A alternativa que apresenta erro quanto à acentuação em uma das palavras é:

a) lápis - júri
b) bônus - hífen
c) ânsia - série
d) raízes - amável
x e) itens - núvens

5. Retire do texto um exemplo de palavra paroxítona acentuada graficamente. (0,1)

Há vários exemplos: água, possível, contrário, ruído, begônias, distância, superfície, jóia, astúcia.


Sucesso!

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