quarta-feira, 10 de setembro de 2008

A IARA


— Vamos à cachoeira onde mora a Iara — disse. — Essa rainha das águas costuma aparecer sobre as pedras nas noites de lua. É muito possível que possamos surpreendê-la a pentear seus lindos cabelos verdes com o pente de ouro que usa.
— Dizem que é criatura muito perigosa — murmurou Pedrinho.
— Perigosíssima — declarou o Saci. — Todo cuidado é pouco. A beleza da Iara dói tanto na vista dos homens que os cega e os puxa para o fundo d’água. A Iara tem a mesma beleza venenosa das sereias. Você vai fazer tudo direitinho como eu mandar. Do contrário, era uma vez o neto de Dona Benta!...
Pedrinho prometeu obedecer cegamente.
Andaram, andaram, andaram. Por fim, chegaram a uma grande cachoeira cujo ruído já vinham ouvindo de longe.
— É ali — disse o perneta, apontando. — É ali que ela costuma vir pentear-se ao luar. Mas você não pode vê-la. Tem de ficar bem quietinho, escondido aqui atrás desta pedra e sem licença de pôr os olhos na Iara. Se não fizer assim, há de arrepender-se amargamente. O menos que poderá acontecer é ficar cego.
Pedrinho prometeu, e de medo de não cumprir o prometido foi logo tapando os olhos com as mãos.
O Saci partiu, saltando de pedra em pedra, para logo desaparecer por entre as moitas de samambaias e begônias silvestres.
Vendo-se só, Pedrinho arrependeu-se de haver prometido conservar-se de olhos fechados. Já tinha visto o Lobisomem, o Caipora, o Curupira, a Cuca. Por que não havia de ver a Iara também? O que diziam do poder fatal de seus encantos certamente que era exagero. Além disso, poderia usar um recurso: espiar com um olho só. O gosto de contar a toda gente que tinha visto a famosa Iara valia bem um olho.
Assim pensando, e não podendo por mais tempo resistir à tentação, fez como o Saci: foi pulando de pedra em pedra, seguindo o mesmo caminho por ele seguido.
Súbito, estacou, como fulminado pelo raio. Ao galgar uma pedra mais alta do que as outras, viu, a cinqüenta metros de distância, uma ninfa de deslumbrante beleza, em repouso numa pedra verde de limo, a pentear-se com um pente de ouro os longos cabelos verdes cor do mar. Mirava-se no espelho das águas, que naquele ponto formavam uma bacia de superfície parada. Em torno dela centenas de vaga-lumes descreviam círculos no ar; eram a coroa viva da rainha das águas. Jóia bela assim, pensou Pedrinho, nenhuma rainha da terra jamais possuiu. A tonteira que a vista da Iara causa nos mortais tomou conta dele. Esqueceu até do seu plano de olhar com um olho só. Olhava com os dois arregaladíssimos, e cem olhos que tivesse, com todos os cem olharia.
Enquanto isso, ia o Saci se aproximando da mãe-d’água, cautelosamente, com infinitos de astúcia para que ela nada percebesse. Quando chegou a poucos metros de distância, deu um pulo de gato e nhoque! furtou-lhe um fio de cabelo.
O susto da Iara foi grande. Desferiu um grito e precipitou-se nas águas, desaparecendo.

(Monteiro Lobato. Viagem ao céu e O Saci. São Paulo: Brasiliense, 1950. p. 266-8,
in Português: Linguagens — William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães)

Estudo do texto:

1. A Iara é uma personagem lendária do folclore brasileiro. Por que sua beleza é tão venenosa quanto a das sereias?
Porque sua beleza dói tanto na vista que deixa os homens cegos e os puxa para dentro d’água.


2. Pedrinho se arrependeu da promessa feita ao Saci.

a) Que preço Pedrinho estaria disposto a pagar para poder contar a toda a gente que vira a famosa Iara?
Ficar cego de um olho.

b) O que essa atitude revela do seu comportamento?
Que Pedrinho é um menino que gosta de se gabar, de se vangloriar, de receber elogios.

3. O combinado era que Pedrinho ficaria com os olhos fechados enquanto o Saci se aproximaria da cachoeira. Ele cumpriu a promessa que fez a si mesmo? Justifique sua resposta.
Não. Ao ver a rainha das águas, ficou tonto com a sua beleza e esqueceu-se de seu plano.

Estudos lingüísticos:

1. Nem todo “o”, “a”, “os” e “as” que encontramos são pronomes oblíquos. Muitas vezes são simples artigos definidos. Se eles acompanham um substantivo, são artigos; se, no entanto, substituem um substantivo, são pronomes oblíquos. Sabendo disso, dê a classe gramatical das palavras destacadas.
Use o código:

( a ) Pronome pessoal do caso oblíquo ( b ) Artigo definido

a. ( a ) ( a ) ( b ) A beleza da Iara dói tanto na vista dos homens que os cega e os puxa para o fundo d’água.
b. ( a ) ( b ) ( b ) Pedrinho viu a sereia; e quando a viu foi logo tapando os olhos com as mãos.


2. Destaque o substantivo que cada pronome pessoal oblíquo está substituindo.

a) A Iara costuma aparecer sobre as pedras nas noites de lua. É muito possível que possamos surpreendê-la a pentear seus lindos cabelos verdes com o pente de ouro que usa.

b) É ali que a Iara costuma vir pentear-se ao luar. Mas você não pode vê-la.

c) Enquanto isso, ia o Saci se aproximando da mãe-d’água. Quando chegou a poucos metros de distância, deu um pulo de gato e nhoque! furtou-lhe um fio de cabelo.

d) O Saci pediu a Pedrinho que não olhasse em direção à Iara. O garoto, teimoso, não lhe obedeceu.

3. Há, a seguir, pares de palavras. Acentue, adequadamente, apenas as paroxítonas. (

a) saci – táxi
b) órfãs – irmãs
c) sutil – inútil

4. Marque a alternativa em que todas as palavras paroxítonas devem ser acentuadas graficamente:

a) bençãos, jovem, hifens, regua, dedo
xb) imovel, dolar, latex, forceps, forum
c) comercio, especie, açucar, virus, ritmo
d) ciencias, itens, joquei, joguem, armario

Sucesso!


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