terça-feira, 14 de julho de 2009

Ladrão que rouba ladrão

O ladrão estava abrindo a porta do carro, chegou o flanelinha:

– Quer que cuide, doutor?

– Tu é burro, hein, cara, não vê que tô saindo?

Entrou no carro, ficou esperando o flanelinha se mandar, ele se chegou:

– Dá um miúdo, tio...

– Te dou é um cascudo, se manda!

Abriu os vidros, o carro estava no sol. O flanelinha correu para um carro que vinha devagar caçando vaga, apontou onde ele estava, ele botou a cabeça para fora:

– Não vou sair, não, ô, infeliz!

Ligou o rádio, o carro era uma sauna. Assustou-se com a cabeça do guri na janela:

– Mas o senhor falou que ia sair.

– Mas não falei que ia sair agora, né, quer me dar paz?!

– Por mim – o guri cantarolou se afastando –, pode cozinhar aí!

– Ele se debruçou enfiando a mão debaixo do painel, achou logo os fios, puxou para fora, fez a ligação. Quando se endireitou pegando o volante, deu de novo com o moleque ali:

– Me dá um dinheiro, tio, senão aviso o guarda! – apontou um PM dirigindo o trânsito lá no cruzamento.

Era um guri miúdo e vivo, devia ser muito ligeiro, então ele enfiou a mão no bolso, tirou umas moedas.

– Dinheiro, tio, dinheiro, moeda não!

Ele deu uma nota, o guri puxou outra.

– Ladrão!

– Só eu, tio?!

Ele deu partida, o motor pegou na primeira, ele agradeceu a Deus (sim, a Deus). Arrancou logo, passou pelo guarda, aí foi resmungando que ladrãozinho, que ladrãozinho:

– É por isso que o Brasil não vai pra frente!

PELLEGRINI, Domingos. Ladrão que rouba ladrão e outras crônicas – Coleção para gostar de ler, n° 33, 1ª ed. Ática, 2002.

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